terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

Carreiros


   Mansores - Vista típica dos campos de cultivo em socalcos





Carreiros
               
Talhados pelos pés, de gente cansada,
descalços ou arrastando algum calçado,
serpenteiam as encostas, todos os vales.
levam-nos a todos os lugares do mundo,
deste pequeno mundo, pois não há mais nenhum,
assim como este, feito à medida dos pés,
que por eles passam as vezes que puderem,
não as que quiserem.
De passo mais demorado quando encosta acima,
desenfreada corrida de canalha, encosta abaixo,
ou acima. Nem o pregueiro a apanha:
- Tomem lá juízo, tenham cuidado, ainda arranjam trabalhos!
- Raios partam a canalha, não ouvem, ou não querem saber.
Apenas da largura de ombro a ombro,
o mato ali não cresce. O chão polido,
suave aos calcanhares descalços.
Vistos de longe, quando o mato cobre gente,
mais parecem luras de coelhos.
Encurtam caminho, não as canseiras,
não o esforço, de canado à cabeça,
Algum molho de lenha ou carquejas,
Uma giga de erva cortado no lameiro.
O açafate com o comer para os Homens,
com algum cuidado, não vá o caldo entornar.
Para quem pelos montes anda a trabalhar,
lá mais em baixo, junto ao rio,
lá mais em cima, nas pedreiras,
aquelas onde a pedra é dura de roer.

Desde o começo do mundo,
deste pequeno mundo,
sempre existiram, nem sempre existirão.
Não conheciam dono nem senhor,
apenas os caminhares que por eles passavam.
Respeitados outrora, estimados,
pelo povo que labuta, caminhos sagrados.
Passava o pobre e o rico, o mendigo e o ladrão,
Todos à procura de ganhar o pão.
Para as festas nas Ermidas, lá no alto,
para os lameiros, junto aos rios,
às levadas, para os moinhos.
Para as pedreiras, lá no Castêlo,
onde a pedra dura, de granito,
deixava o corpo do pedreiro aflito.
Paulatinamente abandonados,
depressa foram apoderados.
Restam poucos, fica a lembrança,
ainda uma réstia de esperança,
de que estes ainda perdurem,
desejando o regresso dos caminhantes.

Aos carreiros que outrora ligavam toda esta pequena Freguesia de Mansores. Estreitos, apenas para se passar em fila indiana, alargavam-se quando alguém se cruzava em sentido contrário. Não se ficavam pela Freguesia, prolongavam-se por todas as Freguesias vizinhas com quem se fazia fronteira. Sem impacto ambiental, apenas se reconheciam pelo chão polido, sem vegetação. Alguns mais trabalhados, com pequenas escadarias, para melhor se ultrapassar os declives. Poucos ainda restam. Já poucos os respeitam, muitos foram tomados pelos donos dos terrenos com quem confrontavam. Todos assistimos de braços cruzados, não querendo levantar a voz, denunciar quem comete este abuso. O poder local é complacente e conivente nesta tomada de posse de muitos carreiros pelos proprietários dos terrenos que confrontam com os mesmos. O mesmo se passa com os terrenos ditos “maninhos”, muitos de uso dos aldeões para terem os seus lenhais, o mato para a cama do gado. Desde os primórdios que os seus antepassados fizeram uso deles. Agora, tudo é retirado, tudo é vedado, já pouco resta. Sinais dos tempos do Homem.


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