( Cruzeiro, simbolo da religião católica - em frente à Capela de Santo António - lugar das Agras - Freguesia de Mansores - Concelho de Arouca )
Falar sobre os sinais dos tempos
sempre foi algo que me despertou muita curiosidade. Sempre que o faço muitas dúvidas
me surgem. Tenho por hábito procurar nos escassos conhecimentos que tenho da
história mais recente, algo parecido, algo que aparentemente já se tenha
passado, em tudo semelhante ao que se vive hoje. É sempre um passo no escuro
fazer uma espécie de “colagem” das soluções achadas nesses tempos para resolver
problemas iguais ou em tudo semelhantes. Fácil é compreender que o que lemos ou
estudamos do passado é um registo de Homens. Por esse facto, a informação que
adquirimos é simplesmente a visão de quem relatou esses acontecimentos. Por
muito imparcial que o “historiador” ou o “cronista” do passado tenha sido,
nunca deixará de ser a sua percepção dos acontecimentos que presenciou ou que
obteve informação. Encontramos com alguma facilidade relatos muito diferentes
deste ou daquele acontecimento. Sei que na maioria dos casos não houve intenção
de deturpar a realidade, apenas o “contador” relatou, anotou os factos que para
si suscitaram maior interesse, foram mais marcantes. A associar a tudo isso,
estamos muito dependentes da mensagem que ele nos queria transmitir. Por vezes
determinado acontecimento apenas serve como catalisador para exprimir as suas
teses, serve de pano de fundo ao cenário que pretende elaborar. Dito isto desta
forma fica no ar a suspeição de toda a história que está narrada em todos os
livros ou outras formas de a transmitir. Basta pensarmos num acontecimento que está
hoje a acontecer e colocarmos dois “historiadores” que há partida sabemos que
tem visões politicas, religiosas, enfim, personalidades muito diferentes. Se de
seguida analisarmos o seu trabalho verificamos que a mensagem do mesmo
acontecimento por vezes é antagónica. Um pouco a história do copo meio cheio ou
meio vazio. Tem mais impacto quando além da narrativa observamos as imagens
colhidos por um ou por outro. Dai se concluir facilmente que a opinião do
cidadão comum pode muito facilmente ser viciada, controlada para os aspectos
que a informação pretende. Ou seja, sabemos que a uma determinada informação o
ser comum reage maioritariamente de uma certa forma. Se queremos que se apoie
uma causa, falamos apenas dos aspectos positivos, compomos a informação com os “ingredientes”
próprios, não a “contaminando” com os possíveis acontecimentos “colaterais” que
possam existir. Se queremos construir uma barragem falamos dos benefícios da
energia eléctrica que vai ser produzida e do seu impacto positivo nas nossas
vidas, não esquecendo a parte ecológica. Se somos contra vamos referir o impacto
ambiental, a modificação do habitat de muitas espécies, a alteração do leito do
rio, a destruição de uma paisagem paradisíaca para o turismo e para as espécies
que nela habitam, os terrenos que vão ficar submersos sem produzir, etc. Não é fácil relatar um acontecimento sem o “contaminar”,
deixando todo o espaço para que o leitor possa de uma forma o mais abrangente possível
tirar as suas próprias conclusões, elaborar o seu parecer, a sua opinião. É
necessário para se entender melhor qualquer acontecimento reunir várias versões
do mesmo, procurando obter os elementos que achamos de todo necessário para visualizarmos
mentalmente todo o acontecimento. Desde os aspectos sociais da época, políticos,
religiosos, culturais, tudo tem que ser considerado parte substantiva do
acontecimento que pretendemos interpretar. Se alguém dá um tiro noutro, o acto
por si só é reprovável. Se no entanto o descrevermos como agindo em sua própria
defesa o julgamento moral que fazemos é diferente. Muitos exemplos se podem
falar para tentar validar esta “teoria”, esta forma de ver as “coisas”.
É importante perceber que não
estou a falar nos casos em que o descobrimento de novos factos vem deitar por
terra conceitos tidos como verdade absoluta. Essa situação é completamente
diferente. O que eu tenho estado a falar é da forma como se vai registando,
interpretando a história e essa interpretação vai sendo difundida, ensinada a
todas as gerações vindouras que não presenciaram os acontecimentos. Costumo
chamar aos historiadores “fazedores da história”, mais especificamente, “aos anotadores
da história”. O termo “fazedor” é prepositado dado que considero que a história
que existe escrita ou registada sobre tudo que aconteceu ou vai acontecendo é
em parte fruto da criatividade, do engenho, da visão pessoal do historiador, e
o acontecimento em si é apenas uma mera forma de “acreditar” a sua tese, a sua
forma de valorizar este ou aquele conceito, pensamento. Não estou a chamar “mentiroso”
ao historiador. O meu conceito de mentira é diferente, consiste em deturpar propositadamente
e com fins objectivamente bem definidos o acontecimento. Ou seja, o “historiador”
sabe que mente, mas fá-lo com uma determinada lógica, objectivo. No caso “tradicional”
o historiador esforça-se por registar o mais exaustivamente em pormenores o
acontecimento mas está naturalmente “condicionado” ao estatuto de ser Humano, e
como tal, sujeito às “deturpações” naturais da sua forma de interpretar e
consequentemente registar o acontecimento.
Ao exprimir esta forma de ver,
surge naturalmente uma questão elementar: qual será a melhor forma de registar
um, acontecimento, fazer a história? Acho que não existe uma que seja apelidada
de “verdade absoluta”, objectivamente e subjetivamente “imparcial”. Resta-nos em ultimo caso, estarmos atentos,
procurarmos sempre várias fontes para as contrapormos, conhecermos a
personalidade do historiador, para então conseguirmos elaborar mentalmente todo
o acontecimento, todas as envolvências possíveis da passagem que estamos a ler
ou a estudar. Eu sei que todo este pensamento é teórico, talvez inexequível.
Devemos concluir que a verdade absoluta de um facto ou acontecimento
dificilmente existirá. Não devemos à partida excluir outros pontos de vista
diferentes, muitas vezes o oposto do que achamos ter sido. Quantas vezes, após
presenciarmos um acontecimento e mais tarde quando o descrevemos, somos
confrontadas com certas perguntas para as quais não temos uma resposta que
possamos afirmar convictamente de ser “a verdade”? O ditado é velho: “ quem
conta um conto, acrescenta um ponto.”
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