domingo, 22 de julho de 2012

" Desacreditando "

     
  ( Largo de Santo António, conhecido como " adro da Capela". Hoje diferente, muitas memórias ali continuam vivas, em mim. )           


Decerto já lhe aconteceu dizer uma frase da qual não tinha dúvida alguma, e ser confrontado com um argumento que jamais havia imaginado. Fica-se por momentos sem ar, sem sequer saber como se respira. Mas é apenas um momento, o tempo de interiorizar toda essa nova informação, como quando se dá uma queda e logo nos levantamos. Apressados, sacudimos as palmas da mão que foram as mais sacrificadas. De imediato procuramos contra-argumentar, ou pelo menos explicar o porquê da nossa forma de ver a situação. É bom ter alguém que nos faz pensar mais um pouco, faz sentir que temos de estar atentos e prudentes. Gosto de ter a minha opinião sobre quase tudo que se passa. Tenho por hábito, bom ou mau não sei, o de relativizar tudo em função do que acho que conheço. Um pouco como quem aprende a fazer as contas de somar, subtrair, multiplicar ou dividir. Acho que consigo fazer todas as contas que me coloquem, que consigo entender tudo, opinar sobre todo e qualquer assunto. Tento sempre arranjar forma de estar à altura dos desafios que surgem. Mas também sei que é uma mera ilusão. Sei que se sabe quando as situações me ultrapassam, estão para além do que possa compreender. Nessas alturas remeto-me para um certo silêncio, escuto e procuro entender. Muitas vezes não concordo, não visionário dessa forma de sentir as coisas, mas no silêncio fico por não saber argumentar o meu desacordo sobre a posição dominante. Tantas vezes argumentando interiormente, guardo para dentro para mais tarde voltar a reflectir sobre esse assunto. 
Não considero obrigatório ou essencial pensar ou agir como as maiorias. Mesmo sendo a parte mais pequena, menos forte, não tenho por hábito entregar os pontos, erguer a bandeira branca. Talvez seja um pouco casmurro no pensar, no viver. Poucos exemplos temos na actualidade que nos arrebatam, nos levem de corpo e alma a segui-los, a defender a sua causa como cousa nostra. Agora tenho um grande dilema que não consigo resolver. Como me encontro sozinho a escrever, apenas como companhia a musica, não posso afirmar de todo se estou a ser correcto na avaliação que faço, ou simplesmente parcial dado não me incluir em tal elite. Quero apenas dizer que tenho dúvidas quanto ao que penso sobre o verdadeiro valor das pessoas que comandam o mundo. Tudo a todo momento se orienta por uma determinada hierarquia. Mesmo no caos, determinadas leis estão presentes. Dá-me a entender que a anarquia não existe. Acontece muitas vezes um desfasamento entre vários mundos, várias realidades. Vejamos os casos mais abundantes que são o de desordem publica. Enquanto as forças policiais tentam segurar, chamar ao seu mundo que dominam, as multidões, estas teimam em fazer valer uma nova hierarquia. Hierarquia essa que se revela em quem ousa ser o mais destemido, o mais ousado de toda aquela agitação que domina o coração dos revoltosos. Conflito entre dois mundos opostos. O equilíbrio que existe entre as forças intervenientes vai fazer depender a duração deste aparente caos. Mas nada mais é que uma discrepância entre realidades, como um degrau, uma camada da crosta terrestre que se parte e se desnivela da anterior realidade, do anterior equilíbrio. No caso dos revoltosos levarem a melhor, a hierarquia que se irá estabelecer será diferente da anterior, mas irá ter regras, não iguais mas existirá sempre uma hierarquia. Como é natural, a "moeda" adoptada será diferente, própria desse novo "reino", decerto à semelhança dos seus Reis. Os valores com que se regem serão diferentes, talvez antagónicos aos da hierarquia aniquilada. Isto porque as revoltas sempre se fizeram com a camada inferior a querer virar o contrário. Um pouco como quando se lavra a terra para uma nova sementeira. A camada superior irá ocupar a inferior e vice versa. Os mais rezingões serão donos deste novo caos que obedecerá a novas regras, a novos valores.
Mas seja lá qual for o novo equilíbrio, irão suceder de um lado ou do outro os que não se conformando, dão o corpo e a alma em defesa do que acreditam, do que julgam ser o melhor. Decerto "pouco espertos" ao enfrentarem tamanho adversário, tal inimigo, sucumbem quase sempre, tornando-se eternos mártires para aqueles que fazem parte da sua "aliança".
Sempre tive um certo receio das revoluções, dos momentos em que existem duas realidades desniveladas, à procura do equilíbrio, do novo equilíbrio. Neste espaçamento do tempo, das mudanças que vão acontecendo, existe uma hierarquia diferente, os valores para se manter vivo são também eles diferentes. O caos surge nos instantes em que há o colapso de uma das estruturas, de todos os valores que são aniquilados pela força dominadora, por quem tem o poder e o usam como a lamina de uma espada para decepar as cabeças dos que se lhe opõem, dos que lhe fazem frente não só com o seu corpo, mas com a sua alma. Um pouco à imagem do que acontece quando existe um cataclismo natural e determinadas espécies da fauna e flora desaparecem  no momento em que se dá, ou por inadaptação à nova realidade,  por inexistência de "espaço" para a sua existência, o mesmo acontece na selva das civilizações humanas. Existem muitas "espécies" que não se adaptam, não aceitam o novo equilíbrio.  Para elas será o fim. Algumas, mais astutas, como que hibernam, esperando o momento certo para novamente se libertarem, semearem o caos em busca da mudança, de uma nova hierarquia estabelecerem. Ao longo da história conhecida sempre assim foi. Por mais ou menos tempo, determinadas hierarquias desapareceram, dando lugar a outras. No fundo o mundo terá sempre os seus Reis, os seus Imperadores, os seus Ditadores, os seus Presidentes, os seus Homem Santos, os seus Líderes e nunca faltará a " camada inferior".  

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