Na semana
passada, passei junto a um pequeno edifício que é único no lugar. Fica num sítio
muito bonito, no lado nascente do meu lugar. Tem uma arquitectura bastante simples,
simétrica, como uma borboleta. Dividindo ao meio, cada parte é o oposto da
outra. É mesmo assim, tendo como eixo da simetria o meio da construção, onde
estão duas placas de mármore: a maior em cima e a mais pequena em baixo. Entre
elas ergue-se um pequeno mastro em ferro pintado que nasce de uma pedra em
granito muito bonita e se eleva em direcção ao céu de forma oblíqua à parede do
edifício. Descrevendo o que os olhos vêem de frente, as janelas são imensas por
onde entra toda a luz do Deus sol. Em cada extremidade existe um pequeno átrio
que dá para a sala onde cabe toda a luz que entra pelas janelas, que são imensas, e uma porta no canto ao fundo que dá para as casas de banho para as meninas, os
meninos e também para a Senhora Professora ou o Senhor Professor.
Ia acompanhado
com a minha mãe. Estamos no outono, as folhas que se deixaram cair dos ramos
das árvores, adormecidas, juntaram-se todas junto ao portão da entrada.
Quietas, todas juntinhas, estão barrando a passagem, que já há algum tempo
deixou de o ser.
- Já não se
ouvem as crianças! – Disse a minha mãe de um jeito triste, como que suspirando.
Parei, olhei mais do que os olhos podiam ver. Também suspirei, como quando
olhamos alguém que junto a nós jaz. Fez-se uns instantes de silêncio, cada um
olhou e deixou o olhar por aqueles portões entrar, no recreio um pouco brincar
para depois na sala entrar e juntar-se a toda a luz do lugar que ali se sentava
nas carteiras, de frente para a ardósia que era preta e de seguida iria ser
pintada do branco mais puro que a natureza nos dava. Decididamente o silêncio
era assustador. Só um pouco do som das folhas secas, adormecidas, que o vento
ali deixou, todas juntinhas, depois de com elas brincar. Neste momento era dos
poucos que pelo recreio podia correr, jogar à macaca, ao pião, à barra do
lenço, do penico, jogar à bola. Para mim, o momento foi desolador. A minha
infância parecia ali adormecer, junto a ela para que não se sentisse triste,
só. Tinham-lhe roubado todos os filhotes, era uma mãe enlutada que chorava a
perda dos filhos, aqueles que também eram das mães da aldeia. Decerto não
compreendia tal, sempre se dera de corpo e alma aos ensinamentos, às
brincadeiras do recreio, a tudo que é natural acontecer entre mãe e filhos.
O sol, todos os
dias, por ali passava o dia, sempre na esperança de reencontrar as luzinhas que
nasciam em quase todas as casas da aldeia, tantas vezes mais do que uma. Por
certo, passavam os dias a conversar na linguagem que só eles sabiam, mas que eu
imagino também compreender. A minha mãe adorava aquela casa tão cheia de
significado, mesmo para quem nunca se tinha sentado nas suas carteiras, ido ao
quadro ou brincado no recreio. Mas não estou a ser correcto. Olhando-a, pensando
mais profundo, também ela como todas as mães da aldeia se tinham sentado nas
carteiras juntamente com as luzinhas que tinham dado à luz, que tinham cuidado
e iam cuidando. Pensando melhor, toda a aldeia se sentava todos os dias da
semana naquelas carteiras que davam para o quadro, que ensinavam como viajar no
mundo maravilhoso da magia que os livros lidos têm. O Senhor ou a Senhora professora sempre os
acolhiam para lhes ensinar um mundo novo. Novo na magia das palavras que até então
eram só faladas. Das contas que eram de somar e tantas vezes se sumiam para dar
lugar à brincadeira. Das lousas pequeninas que cabiam na sacola de pano e que
eram filhas da mãe ardósia, também preta, aquela que lhes ficava em frente
quando estavam sentados nas carteiras. Ai a dor que não é só minha, mas que também
é. Aquela que já foi minha e de tantos meninos e meninas que pintavam a aldeia
de um colorido diferente com as suas vozes que ecoavam por todo o lado. Ai de
mim que aqui estou perante Ti, que já foste minha, e que em nada sinto poder
valer-te. Também eu com a graça de Deus te dei as minhas luzinhas para que as
acolhesses dentro de ti, em ti aprendessem também o mundo mágico que só tu
sabes ensinar o caminho para lá chegar, quem sabe por lá ficar sempre que
apetecer. Perdoa-me pelo que não fiz e talvez devesse fazer. Perdoa aos Homens
que te enlutaram, os teus e os nossos filhos roubaram. Perdoa-lhes pois Eles
não sabem o que fazem.
Dia 05 de Outubro de 2012
"A Vida é uma escola" :)
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