quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Moleira e padeira


Moleira e padeira

Devagar desce a encosta,
com o saco à cabeça.
Devagar, não aconteça
Trambolhão de que não gosta.

Devagar, mas tão ligeira,
sempre com muita canseira.
O saco de grão de ouro,
um valioso tesouro.

O  carreiro é bom caminho,
até ao rio, ao moinho.
Grão de ouro para relar,
em pó de prata ficar.

Despeja o saco do milho,
Para o encher com farinha.
E regressa depressinha,
para dar o pão ao filho.

Suas mangas arregaça,
vai farinha peneirar.
Com água quente se amassa,
depois fica a “levedar”.

Toda juntinha ali fica,
com  a Cruz talhada à mão.
A Deus reza uma oração
para que dê vida, pão.

O forno vai aquecendo
Com lenha que vai ardendo.
Não tarda a barriga encher,
e ricas broas cozer.

A massa toda rachada,
hora de ir para a escudela.
Vira, rebola e agrada,
para a pá, forno com ela.

Bem alinhadas estão.
Fecha-se a porta, senão
calor foge, sem cozer.
É só esperar até ver.

Daqui a pouquinho, a nada,
Abre a porta, encantada.
Tostadinha, que riqueza,
Vamos todos para a mesa.

O moinho de água, no fundo da encosta, junto ao rio. Ficava depois da levada onde se captava a água para o fazer girar. O grão de oiro, depois da espiga malhado, era estendido em eiras, ao sol, para secar. O pão que um dia foi grão, foi semente, semeado na terra lavrada. Nasceu e, com muitos cuidados e canseiras, cresceu. Virou “homem de barba escura”, amadureceu. Depois, foi colhido, desfolhado e no canastro guardado. Viria a cair na eira soalheira, para com os manguais ser do casulo retirado. Ainda “verde”, ao sol andou a secar. Limpo as vezes que foi preciso, pelo crivo ou pelo “erguedor”, nas caixas de madeira foi guardado. Depois viajou dentro do saco, em cima da cabeça do moleiro ou da moleira. No moinho, muito girou, até que em farinha ficou. Regressou a casa, onde foi amassado; de seguida, levedou e para o forno se encaminhou. Em ricas broas de côdea tostadinha ficou; no centro da mesa, a tantos alegrou.  

Homenagem ao moinho de “rio mau”, onde, em pequeno, fui muitas vezes levar o milho para moer e a farinha de volta trazer. Hoje, é apenas um monte de escombros, fruto da “ingratidão” dos homens da minha geração. Gostaria de o ver restaurado, a funcionar. Mas eu sei que é muito dispendioso, dizem não valer “a pena”. O que é que hoje “ vale a pena”?

Terça-feira, dia 13 de Novembro de 2012 

Sem comentários:

Enviar um comentário