Esboço de um diário
Hoje foi um
dia enfadonho. Quase nada de novo, desde o acordar ao deitar. As tarefas miúdas
vão preenchendo os movimentos durante quase todo o dia. Pouco tempo resta para
me aventurar noutras conquistas. Vou protelando alguns projectos que sempre vou
magicando. Eu sei que são apenas esboços mentais disto ou daquilo. Alguns
acabam tornando-se realidade. Alguns, mas sempre muito poucos. O que na mente
me parece valer a pena, logo que os arrasto para a realidade, acontece
esfumarem-se. Quase sempre inexequíveis, por falta de vontade ou por assim o
serem. Mas nunca deixo de os imaginar,
cada vez mais. O tempo hoje esteve murcho, sem a luz que eu necessito para
fazer fotografia. O Outono é assim mesmo: pensativo, nostálgico, um adeus
demorado ao seu irmão Verão, que para outras paragens teve que se ausentar.
Prometeu para o ano voltar. Não o disse, mas eu sei que assim será. Nunca
faltou à palavra, mesmo não pronunciada. Que seria de mim se as estações não
regressassem sempre? Mas agora é o Outono que me vai fazendo companhia. Também
eu ando um pouco nostálgico, arrastando um caminhar por entre a folhagem que
vai cobrindo todo o chão. O chão que se esconde, adormece, abrigando-se do
inverno frio e chuvoso que por ai não tarda. As folhas são cada vez mais,
espalhadas por todo o lado. Vou poisando meus passos com cuidado, para as não
magoar. São de tantas cores, quentes, como as lareiras que se aquecem com as
suas fogueiras. As árvores vão-se despindo, numa nudez sem constrangimento.
Adormecem, hibernam, apenas esperando acordar na próxima Primavera, que também
sempre regressa. O vento vai ajudando, sacudindo todas as folhas que se vão
desprendendo, numa suave queda, para não se magoarem. Sabem que um dia irão
reencarnar, viver outra vez, depois de uma breve passagem dentro do útero
materno, a terra mãe. Todos os elementos que se decompõem, poderão um dia
regressar à vida, numa outra qualquer forma. Poderão ser alimento, energia,
argamassa, tijolo, ferro ou madeira de uma nova construção, obra da vida, da
eterna vida que se regenera, imortal, assim se deseja.
É bom sentir
esta forma de imortalidade dos elementos que compõem a natureza. Nunca ouvi um
cientista defender que, as diversas formas de flora que existem, tenham algo
equivalente ao que nós chamamos de “sentimentos”. Também elas nascem, crescem,
atingem a sua “maturidade sexual”, dão os seus filhos, as sementes, e um dia
desfalecem, não sei se “morrem”, se imortais são. O conceito de morte para os
humanos é próprio. Na “outra natureza” que nos rodeia, não consigo imaginar o
que quer que seja. Sei que, quando os meus filhotes eram pequenos, quando
morria algum animal de estimação, existia um “Céu” só para eles. Uma forma de
se aliviar a dor da perda, uma forma por não se saber de que outra forma podia
ser no seu entendimento. O acreditar, o ter fé é tão essencial nas nossas
vidas, nas nossas vivências. Nunca deixaremos de ser “crianças”, acreditar que
existe sempre mais alguma coisa, mesmo depois do “infinito”.
Por hoje são
apenas estas linhas que contigo confidencio. Aguardo melhores dias, para te
encher das muitas novidades que existirem para contar. Apenas estas linhas
escrevo, para dizer que nunca me esqueço de ti, por muito pouco que tenha para
partilhar. Até breve.
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