domingo, 20 de maio de 2012

Adivinha

Todos nós gostamos de uma boa anedota, uma adivinha, uma conversa mais trivial que nos remete para as coisas simples mas que sempre gostamos que estejam presentes. Uns nascem para as contar outros para as escutar. Tenho uma paixão por escutar a sabedoria popular, os saberes que marcam certas figuras típicas de todas as terras deste cantinho. Faz parte, está incrustada no ser, no viver. As adivinhas, as anedotas, os provérbios são uma identidade que continua viva no Nosso povo, o tal que lava no rio. À falta de jeito para contar, por vezes fico a imaginar, a tentar inventar.

Por todo o lado estão
Diversas no tamanho e cor.
Num canteiro ou no chão
Mas logo que as conhecemos
mudam de género, que confusão.
O que são?

Canta mas não fala.
corre mas não tem pernas.
Sobe ao céu sem asas,
desce à terra sem escadas.
O que é?

Os pés molhados, dois ou mais,
quase sempre estão.
Levam-nos de um lado ao outro,
Sem se mexer, que belas são.
O que são?

Come, come e barriga não tem.
Entra grão, sai farinha ou carolo
Gira, gira, e tonto não fica não.
Junto ao rio ou noutro lugar estão.
 O que é?

Sape, sape, sai já daqui.
Lambareiro, sempre à espreita
de um descuido, ai que canseira.
Dorme, dorme, no palheiro ou na soleira.
O que é?

De muitas cores vivas, doce e vaidosa.
Visitas num dia de sol não faltam,
nada trazem, tudo levam ou espalham.
Na primavera tudo alegram.
O que são?

Anda sempre á solta, devagar ou apressado.
Tudo sobe, tudo desce, sem se cansar.
Gosta dos barcos empurrar, dos moinhos fazer girar.
Mas quando sereno, os ramos faz "baloiçar".
O que é?

Mais do que adivinhar o que eu quero dizer, é explicar cada frase, o seu simbolismo. É muito comum na minha terra dizer-se "sape gato". O que se pretende é por o gato dali para fora, que está a incomodar ou alguma coisa a estragar. Um pouco como " xô galinha", "ei, chega-te ao carro", e tantas outras expressões que agora não lembro. Às vezes ler o que alguém escreve tem disto. Mia couto ensina-nos a não termos vergonha do nosso jeito de falar, da nossa pronuncia, dos nossos termos. Sempre serviram para comunicar, sempre foram compreendidos no meio em que vivíamos. Vem os senhores doutores lá de Coimbra, e não só, apelidarem-nos de parolos, de provincianos, de "burros", de gente sem cultura. Fiquem lá sabendo que na minha terra as "culturas" sempre alimentaram o povo, não serviram para o humilhar, o desvalorizar, xingar, a alma fazer doer. Só me sinto "burro" quando lhes dou atenção, me vergam ao chicote das leis que nos impõem. Ai se eu pudesse, com um vara de vime pelas pernas adiante, "que os tolos também se ensinam". Não me apareçam por cá, senão vai com o que estiver na mão. Seus fedelhos mimados à custa do povo que trabalha. Sois indignos de existir, tal é o vosso préstimo. " Ora e labora" era o lema de muitos frades e freiras. E assim é que devia ser. Escumalha parasita, que se alimenta do suor e das lágrimas dos que sofrem (devido à podridão dos que no poder estão). A verdadeira revolução, se um dia acontecer, brotará do povo, dos que sentem ou compreendem.  
Desculpem este desabafo, mas quando me lembro de certas coisas, chega-me a mostarda ao nariz. Acreditem, quando nos sentimos perdidos somos capazes de tudo se tivermos algo a defender, algo em que acreditamos. Nisso somos genuínos, Não dá para disfarçar, representar. Somos como somos, ainda bem.

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